terça-feira, 4 de setembro de 2012

EM CADA LÁGRIMA DE DOR, O BRILHO DA ESPERANÇA

EM CADA LÁGRIMA DE DOR, O BRILHO DA ESPERANÇA


Seria muito fácil dizer que um dia pensaram em Caps e ... Plim! Eureca! Apareceu!
Seria fácil demais falar que o Caps surge como um serviço substitutivo de uma hora para outra. Perfeito, mediante uma ideia genial, magnífica e perfeita de uma equipe de super-heróis agraciados por super-poderes da reforma psiquiátrica.
Mas a verdade é que não há nada de super-heroísmo, nem de instantâneo, muito menos de perfeito. Tanto a reforma psiquiátrica quanto o Caps, que é um de seus resultados e um grande resultado, foram configurados, construídos, idealizados, batalhados, trabalhados, ... (e o verbo que cada teoria quiser usar, que indique um processo). Aliás, foram, são e tenho fé e desejo de que continuarão sendo realizados.

Galera! A situação não está fechada, esgotada. E o que se encontra hoje de resultados não apareceram e ... abracadabra... plim! simplesmente. Tudo leva-se tempo e suor. A Psiquiatria é referida como jovem, se for basear por Pinel; tem por volta de 200 anos. No Brasil, a Reforma conta da década de 70 para cá.

Estamos acostumados (me incluo demais aqui) a admirar nossos escolhidos mestres ou exemplos profissionais somente como mestres ou exemplos profissionais. Quero dizer que nos esquecemos de que não nasceram assim, de que também sofreram e sofrem processos.

E se por acaso, acontece um engasgo, um mal-estar, alguma tristeza, indignação, raiva, compaixão, dó, revolta por depararmos com ações que representam e materializam um hospício, um sanatório, um hospital geral, um horror do passado, um contrassenso com o que aprendemos, com o que acreditamos, com o que habitamos no peito, lembremos do processo. Lembremos da ausência de mágicas, da humanidade de cada trabalhador da vinha da reforma psiquiátrica.
Aliviemo-nos, porque esta náusea expulsa de dentro de nós a possibilidade do modelo de padronização de um fajuto cuidado. Expulsa de dentro das vísceras a possibilidade de nos orientar pelas hierarquias do poder verticalizado, de nos orientar pela sedução das vaidades dos cargos e aplausos em detrimento do mais importante: O SER HUMANO, em especial, o usuário dos nossos serviços.

Por isso, ALEGRIA, ainda que estranha ou às avessas. COMEMOREMOS a possibilidade de também trabalharmos em pró da reforma. E não importa o quão homeopáticas sejam estas doses de trabalho, pois é com o respeito aos limites de cada adoecimento é que plantamos as sementes de saúde.
Se preciso for, sejamos a própria esperança resiliente e verde em um matagal sem vida e sem cor. Sejamos a esperança água, a esperança adubo, a esperança jardineira, a esperança cuidado, ... a própria realização de flores e frutos e flores e frutos e flores e frutos.

Enquanto isso, como diz, lembro-me com carinho, a mestra Bárbara, “reguemos o vínculo” e, modificando um pouco, “reguemos também a esperança”.

Lillian Naves


2 comentários:

  1. Querida Lilian, devemos ser desertos povoados de fauna e flora e produzir micropolíticas no cotidiano de nosso trabalho que sejam lampejos de luz sobre a obscuridade das práticas manicomiais, pois a reforma se faz todos os dias, e se transforma em novos agenciamentos mais potentes e coletivos, deixo aqui uma citação do Deleuze para você:
    Não se deve perguntar qual é o regime mais duro, ou o mais tolerável, pois é em cada um deles que se enfrentam as liberações e as sujeições. Por exemplo, na crise do hospital, como meio de confinamento, a setorização, os hospitais-dia, o atendimento a domicílio puderam marcar de início novas liberdades, mas também passaram a integrar mecanismos de controle que rivalizam com os mais duros confinamentos. Não cabe temer ou esperar, mas buscar novas armas (DELEUZE, 1992, p.220).

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    1. Josi, as palavras alimentam a alma, revigoram o desejo de persistir resiliente. Abraços gratos!

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